A bola da vez: crise energética!

A turbulência no setor de energia está provocando inquietação na economia mundial que busca deixar para trás a depressão pandêmica.

A bola da vez: crise energética!

turbulência no setor de energia está provocando um calafrio de inquietação em uma economia mundial que busca deixar para trás a depressão pandêmica o mais rápido possível. Gás natural e carvão, em níveis recordes; petróleo, em torno de 80 dólares (430 reais) o barril, ainda longe de seu pico em 2008, mas mais ainda de seu mínimo em abril do ano passado, com a eclosão da crise da covid-19; a China, a fábrica mundial, engolfada em uma onda de apagões que ameaçam causar estragos em sua indústria; a conta de eletricidade, puxada pelo gás e o aumento do preço dos direitos de emissão de CO₂, erodindo o poder de compra de muitas famílias justo depois de um período de sofrimento econômico.

Um quadro preocupante, em um mundo já sobrecarregado por cadeias de suprimentos estressadas e com mal-estar social acumulado após o drama pandêmico.

Em retrospecto, uma convergência de vários fatores —um inverno muito frio, baixa produção de energia eólica no verão, demanda disparada pelo boom no consumo pós-pandemia, tarefas de manutenção nas plantas russas e norueguesas (os dois maiores fornecedores europeus)— explica a escalada de preços. Em termos de projeções, destaca-se um fator essencial como condicionador da trajetória futura.

O hemisfério norte por exemplo está prestes a entrar na estação fria, quando a demanda dispara. E um segundo inverno gelado, depois das tempestades de neve e gelo do ano passado na Europa e nos Estados Unidos, tornaria as coisas ainda mais feias, o que pode agravar em todo o mundo. 

Ao contrário de outros momentos críticos do passado, a escalada de hoje não afeta uma única fonte de energia primária, mas todas elas. Por trás dessa escalada, além dos fatores acima mencionados há também uma diminuição do investimento na exploração e produção de combustíveis fósseis: mesmo as empresas de petróleo mais icônicas há tempos fogem de poços para abraçar moinhos eólicos e painéis solares.

“Pararam de investir em hidrocarbonetos sem levar em conta que eles continuam respondendo por mais de 80% da energia primária consumida no mundo. Claro, é necessário fazer uma transição energética, mas é preciso governá-la melhor”, critica Mariano Marzo, professor emérito de Ciências da Terra da Universidade de Barcelona. “Se o inverno for ruim, as pessoas ficarão muito nervosas e problemas de abastecimento não podem ser desconsiderados.” Até o final do ano, confirma Samantha Dart, chefe de análise de gás natural da Goldman Sachs, tudo vai depender da variável meteorológica: se as temperaturas se desviam para baixo de sua média histórica, haverá problemas; caso contrário, os preços começarão a cair antes da chegada do segundo trimestre.

“O contexto que não pode ser esquecido, e no qual esta crise se inscreve, é o da fragilização da classe média há 30 anos como resultado da globalização. Hoje, qualquer desdobramento que afete o poder de compra é perigoso. Os Governos estão sentados sobre um barril de pólvora”, considera o geógrafo francês Christophe Guilluy, autor de vários ensaios que estudam esse fenômeno, incluindo O fim da classe média; A fragmentação das elites e o esgotamento de um modelo que já não constrói sociedades (Editora Record) e Le temps de gens ordinaires (Editora Flammarion). “Se os preços altos persistirem, existe o risco de desencadearem um novo movimento de protesto.

Hoje, os movimentos sociais não se assemelham aos do século XX, têm uma dimensão cultural e existencial. É uma luta pela sobrevivência.

Fonte: El País
Photo By: Rodion Ktsaev